
"Muito cuidado para não passarem o dia inteiro na cama, parados ou em movimentos acrobáticos. E para não acabar com os biscoitos da despensa e as cervejas do congelador numa só tarde. O ideal é que se tornem cúmplices em atividades menos vorazes. Em vez de ficarem se consumindo um ao outro, ou consumirem o supermercado do mês numa semana, convém utilizar suas semelhanças para finalidades mais sóbrias, como colecionar objetos de arte, gravuras antigas e canetas tinteiro. Em breve se tornarão, mais que um casal, um verdadeiro acervo."
"O boi tem uma vida monótona e restrita. Melhor, muito melhor, um dia de touro: triunfo e morte diante de uma arena lotada." - Banderas, que não é taurino mas pegou o espírito direitinho
Dois meses, dois Touros. Que momento.
Começou num setembro, sob os auspícios do signo oposto. Escorpião - o único capaz de nos fazer frente - estava quase batendo às portas quando aconteceu.
Saí da pista de dança lotada para buscar mais gelo. Quando pouso meu copo no balcão, no único canto onde pude alcançá-lo por entre a massa de pessoas, um braço me enlaça a cintura e me puxa para a esquerda. Larguei o copo e me virei. Sobre o balcão, dois copos de tequila. Encostado no balcão, o touro me olha e propõe: eu bebo a tequila se puder tomar o sal no teu pescoço. Pobre touro, desacostumado com novilhas. Ele achou que ia ser fácil desse jeito?
Retruquei. Não bebo tequila, mas me contentaria com um Jack Daniel's. E o sal, só se for nas costas da minha mão.
Foi o que bastou.
Saímos dali em cinco minutos para um lugar, digamos, mais reservado, onde só o que fez foi ficar mais e mais quente. Calor dos infernos, aquele dia. Tão quente que dissipou todo o álcool de mim antes que eu fizesse alguma coisa mais efetiva - superego strikes back. Prometi que da próxima vez a coisa deslanchava, devolvi um pouco de dignidade às minhas roupas esculhambadas, larguei tudo e saí.
Dia seguinte eu agradeci aos meus surtos de sanidade mental e rezei, do fundo do meu coração, para que a deusa Vênus fizesse todo aquele álcool apagar da mente do sujeito minha lembrança.
Ao segundo encontro ele mal me olhou e eu nunca me senti tão grata por ser tratada com indiferença. Afinal das contas, era uma bobagem. QUASE foi uma GRANDESÍSSIMA bobagem. Não sei o que me deu. Deve ter sido o cheiro, sei lá. Uma premonição entre taurinos.
Dois meses depois...
um legítimo touro espanhol cruza meu caminho.
Eu animadíssima. Aquele homem devia ser fogo na roupa. Taurino e espanhol. Olé!
Mas quanto maior a subida, maior a queda também, né? Se desse pra mensurar o tamanho da decepção... esperei um touro e vi um boi, plácido e tranquilo. Nem tão plácido, nem tão tranquilo, mas decididamente muito longe de toda a promessa.
Só foi taurino no que de pior os taurinos podem ter. Em duas semanas, me senti uma propriedade, pasto particular e privativo, com porteiras fechadas e lacradas com contact para que ninguém visse o que há dentro.
Não preciso nem dizer que a coisa não andou para além de uma pastadinha rápida.
Mas minhas andanças com taurinos não param por aqui. Como sempre digo, o mundo dá voltas.
Mais dois meses...
e um braço me pega de novo, no mesmo lugar. Aquele braço.
E me lembra daquilo que eu tinha dito quatro meses antes. E estava cobrando a promessa.
Quase caí sentada. Xico Sá estava repleto de razão: não dá pra apagar uma mulher da retina de um homem.
Pensei um pouco. Quer saber? Foda-se. Literalmente. Larguei o número do meu telefone na mão dele e esperei a ligação.
Foi o tempo suficiente pra chegar em casa e tomar banho. Quando ele chegou, eu me dei conta de que meu touro era legítimo. Alto, grande, forte. E adorava tomar banho. Vinha de lá todo molhado e se secava em mim num instante, só pra se molhar de novo e ficar nesse brinquedo horas e horas a fio.
Dois meses de finais de semana assim se passaram. Eu andava marcada de dentes, com hematomas, olheiras e calor. Aquele calor maldito e a memória indelével da Vênus.
Até que a pachorra taurina tomou conta do meu touro e eu não suportei. Mandei ele pastar em outras propriedades - o que ele fez rápido demais pro meu gosto e só me deu a certeza de que estava fazendo a coisa certa.
Estou só esperando encerrar mais um ciclo de dois meses pra ver no que vai dar. Já está acontecendo de novo. De dois em dois... a retina segue marcada, tatuada.
 
 
 
 
Um comentário:
Um acervo... sei... de band aids no pescoço! :P
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